Estranho é aquele que assusta, ou simplesmente, não conhecemos. Estranho é algo que incomoda, dá até ânsia... Mas estranho também são aqueles pequenos segundos que se passam antes do momento da comunicação
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Estranho é aquele que assusta, ou simplesmente, não conhecemos. Estranho é algo que incomoda, dá até ânsia... Mas estranho também são aqueles pequenos segundos que se passam antes do momento da comunicação
Estranho é aquele que assusta, ou simplesmente, não conhecemos. Estranho é algo que incomoda, dá até ânsia... Mas estranho também são aqueles pequenos segundos que se passam antes do momento da comunicação. Tem gente que gosta de permanecer estranho, outros nunca o são. É assim o dilema das interações humanas. Será que me estranho ou me faço conhecer?
Acontece muito, nos lugares de compra ou de oferta de serviços. Tipo, quantas histórias estranhas de Uber existem por aí? Vou contar uma, só uma, de tantas que daria até para preencher um livro. Nem sempre há troca, muitas vezes, entramos e o silêncio é total. Muitas vezes, até preferimos que não haja nenhum simples cumprimento de bom dia, boa tarde, boa noite. "Nada de bom, por favor, podemos ir".
De vez em quando, os motoristas contam um pouco deles, falam da vida, das coisas, dos processos e frustrações. Nesse dia, eu não queria chamar o Uber porque queria economizar. Porém, tem dias que optamos pela segurança e pagamos mais. Esse dia, foi um desses dias.
Entrei no Uber, o motorista era um senhor, falou bastante sobre a dificuldade da vida e das coisas. Ele disse que antes dava aulas em uma autoescola, como eles pagavam por hora/aula, nem sempre conseguia ter um salário, nem sempre tinha alunos para ele. "Eu entendo, senhor, também dei aulas individuais de francês, nem sempre tinha uma renda estável". Continuou, e agora foi falando da vida de Uber. Gasolina cara, corridas baratas para o motorista, penúria, cansaço.
Quando eu já estava chegando ao destino, o senhor disse: "Aí eu recebi uma notícia esses dias, que ficou tudo pior, sabe aquelas coisas que paralisam a gente?". Fez uma pausa extenuante... Achei que ele tinha realmente desistido de continuar a conversa. Todavia, ele disse: "Agora, depois de velho, descobri um câncer de pele. Meus filhos nem sabem, não quero preocupar ninguém". Fiquei refletindo sobre aquela confissão, nem os filhos sabiam, talvez fosse mais fácil falar para encontros que nunca mais irão se repetir, afinal não há vínculo, preocupação, não há dor, apenas desabafo.
Eu tentei ser o mais madura possível naquela situação, não havia muito o que externar. Eu disse apenas que a vida muitas vezes nos coloca desafios, mas que não podemos deixar nos abater e que tudo ficaria bem, que ele precisaria ser forte e que hoje em dia há muita tecnologia e formas de tratamento. Falei, desci no meu ponto. Porém, lá no fundo, aquelas palavras desencadearam outras memórias, lembrei de um tio que morreu daquela dita cuja doença, nesse caso não era de pele, não. Mesmo assim, cada instante da vida toca outros momentos que já existiram. Por isso, é muito mais simples falar sem vínculos, mas os vínculos ficam até quando encontros que não se encontrarão mais se findam.