Borboletas

Por Paloma C. Mamede - 27/07/2021


Departure of the Winged Ship - Vladimir Kush

Luís tinha apenas sete anos quando aprendeu a lição mais valiosa de toda a sua vida. Nas férias ele foi passar uns dias com a avó na fazenda. A rotina dele mudou repentinamente, nada de celular, videogame ou desenho animado. Tudo estava ligado à natureza, ao ar puro, ao céu azul e infinito. Foi aí nesse cenário que ele se tornou amigo das borboletas.

Todos os dias de manhã bem cedo, depois que o galo terminava de cantar com afinco, surgia pelo menos três borboletas na sua janela. Ele abria, elas entravam no quarto, brincavam em cada cantinho daquele cômodo e depois iam embora. Esse ritual matutino começou a aguçar a curiosidade do menininho travesso. Logo, ele pensou em fazer experiências macabras, envolvendo velas, fogo, formigas, terra, chiclete, tudo que vinha na sua mente perversa.

Porém, no outro dia ele nunca tinha coragem de pôr aqueles planos malignos em prática. Ele lembrou de algumas lições da escola e percebeu que tinha se tornado amigo das borboletas, um amiguinho não podia machucar outro amiguinho.

Ele desistiu de tudo que pudesse ferir aquelas criaturas aladas e se contentou em rodopiar com elas numa dança cheia de magnificência. Um dia duas borboletas sumiram, esqueceram o caminho da casa, o aconchego dos cantinhos a serem explorados todas as manhãs. Sobrou a menor, mais indefesa e graciosa. Ela tinha asas bem azuis e umas marquinhas de nascença que pareciam as dele, sua mãe chamava de marquinhas de fofura, mas eram sardinhas marrons. Ele ficou feliz, afinal a borboletinha que não tinha se esquecido dele era exatamente a que mais se parecia com ele em todos os aspectos, ela voava meio torta, parecia desequilibrada. Ele também andava meio torto e era desequilibrado.

No dia seguinte, a borboleta sumiu. Luís ficou absorto, nada o agradava, passou o dia inteiro trancado no quarto esperando que ela voltasse. Passaram dois dias e nada... No terceiro, ela apareceu. Luís ficou tão alegre que quando ela pousou na sua mão, ele fechou as duas mãos formando uma jaula de dedos que impedia que o bichinho voasse. Ele apertou, era um aperto que dizia: que saudade, não suma!

Quando Luís abriu as mãos soltando aquela coisinha maravilhosa de seu abraço apaixonado, a borboleta não reagiu. Ele pensou subitamente que ela tinha finalmente percebido que ali era seu lar. Todavia, o desespero foi tomando conta quando ele notou que ela não se movia e tinha falecido. Aquela foi a lição, ele havia se tornado amigo das borboletas, havia desistido de fazer experimentos dolorosos que saciasse a sua curiosidade de moleque, mas assim como tantos humanos ele não sabia que amar significava deixar ficar, deixar ir, deixar voltar e deixar voar.

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